Boas-Vindas
Amigos,
Esta é uma net-expressão da QUINTA DA BORRACHA, vocacionada para os que têm a felicidade de a conhecer, e não só..., que permite partilhar e divulgar as suas actividades e belezas naturais, comentar assuntos e publicar intervenções.
Um local livre, que não faz bem nem mal, antes pelo contrário, mas que pode dar muito ... tanto quanto todos quisermos dar.
Todas as fotos de natureza foram obtidas na própria Quinta
Convido-vos à leitura ansiolítica e ao comentário...
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sábado, 3 de novembro de 2007
Dia de Finados
Bom, agora é o Álvaro de Campos (irmão gémeo do outro) que reinvidica a publicação, oferta graciosa do amigo C.:
"Dia de Finados (integral)
Se te queres matar, porque não te queres matar?
Ah, aproveita! que eu, que tanto amo a morte e a vida,
Se ousasse matar-me, também me mataria...
Ah, se ousares, ousa!
De que te serve o quadro sucessivo das imagens externas
A que chamamos mundo?
A cinematografia das horas representadas
Por actores de convenções e poses determinadas,
O circo policromo do nosso dinamismo sem fim?
De que te serve o teu mundo interior que desconheces?
Talvez, matando-te, o conheças finalmente...
Talvez, acabando, comeces...
E, de qualquer forma, se te cansa seres,
Ah, cansa-te nobremente,
E não cantes, como eu, a vida por bebedeira,
Não saúdes como eu a morte em literatura!
Fazes falta? Ó sombra fútil chamada gente!
Ninguém faz falta; não fazes falta a ninguém...
Sem ti correrá tudo sem ti.
Talvez seja pior para outros existires que matares-te...
Talvez peses mais durando, que deixando de durar...
A mágoa dos outros? ... Tens remorso adiantado
De que te chorem?
Descansa: pouco te chorarão...
O impulso vital apaga as lágrimas pouco a pouco,
Quando não são de coisas nossas,
Quando são do que acontece aos outros, sobretudo a morte,
Porque é a coisa depois da qual nada acontece aos outros...
Primeiro é a angústia, a surpresa da vinda
do mistério e da falta da tua vida falada...
Depois o horror do caixão visível e material,
E os homens de preto que exercem a profissão de estar ali.
Depois a família a velar, inconsolável e contando anedotas,
Lamentando a pena de teres morrido,
E tu mera causa ocasional daquela carpidação,
Tu verdadeiramente morto, muito mais morto que calculas...
Muito mais morto aqui que calculas,
Mesmo mais morto aqui que calculas,
Mesmo que estejas nuito mais vivo além...
Depois a trágica retirada para o jazigo ou a cova,
E depois o princípio da morte da tua memória.
Há primeiro em todos um alívio
Da tragédia um pouco maçadora de teres morrido...
Depois a conversa aligeira-se quotidianamente,
E a vida de todos os dias retoma o seu dia...
Depois, lentamente esqueceste.
Só és lembrado em duas datas, aniversariamente:
Quando faz anos que nasceste, quando faz anos que morreste.
Mais nada, mais nada, absolutamente mais nada.
Duas vezes no ano pensam em ti.
Duas vezes no ano suspiram por ti os que te amaram,
E uma ou outra vez suspiram se por acaso se fala em ti.
Encara-te a frio, e encara a frio o que somos...
Se queres matar-te, mata-te...
Não tenhas escrúpulos morais, receios de inteligência!...
Que escrúpulos ou receios tem a mecânica da vida?
Que escrúpulos químicos tem o impulso que gera
As seivas, e a circulação do sangue, e o amor?
Que memória dos outros tem o ritmo alegre da vida?
Ah, pobre vaidade de carne e osso chamada homem.
Não vês que não tens importância absolutamente nenhuma?
És importante para ti, porque é a ti que te sentes.
És tudo para ti, porque para ti és o universo,
E o universo e os outros
Satélites da tua subjectividade objectiva.
És importante para ti porque para ti porque só tu és importante para ti.
E se és assim, ó mito, não serão os outros assim?
Tens, como Hamlet, o pavor do desconhecido?
Mas o que é conhecido? O que é que tu conheces,
Para que chames desconhecido a qualquer coisa em especial?
Tens, como Falstaff, o amor gorduroso da vida?
Se assim a amas materialmente, ama-a ainda mais materialmente,
Dispersa-te, sistema físico-químico
De células nocturnamente conscientes
Pela noctura consciência da inconsciência dos corpos,
Pelo grande cobertor não-cobrindo-nada das aparências,
Pela relva e a erva da proliferação dos seres,
Pela névoa atómica das coisas,
Pelas paredes turbilhonantes
Do vácuo dinâmico do mundo...
Álvaro Campos"
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1 comentário:
Apenas e só, porque o teu amigo C., através das palavras de Álvaro de Campos, tocou nesta realidade imutável e na qual, teimosamente, nos recusamos a pensar, é que resolvi partilhar neste espaço o que escrevi recentemente quando vi definhar e tombar, a meu lado, uma árvore desta imensa floresta em que todos nós, também, somos árvores.
"Devemos aproveitar as tristezas para darem mais força às alegrias!"
NAU DO DESESPERO
(As brumas do Além)
Voei por cima da bruma do mar
Vi uma nau navegando no céu
Ia lotada de rostos sofridos
Todos envoltos por um branco véu
De pé, à proa, um vulto sem rosto
Mostrando que era ele a comandar
Apesar do medo e das ordens dadas
Alguns teimavam em desembarcar
No murmúrio que chegava até mim
Ouvia gemer e também chorar
Todos sabiam que o seu destino
Era muito além dos confins do mar
Daqueles que acatavam as ordens
Ouvia-se na penumbra uma canção
Nos versos diziam com tristeza
Que a saudade ia no seu coração
O vento dissipou a espessa bruma
E eu para o céu carmesim olhei
Ao ver o Sol brilhar no horizonte
Nas ondas da vida, eu, mergulhei
Um abraço
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